terça-feira, 24 de novembro de 2009

Como abordar um texto que estimula múltiplas leituras? Quais as estratégias para se trabalhar com textos complexos?

por Lúcio José de Azevêdo Lucena

Quais as estratégias para se trabalhar com textos complexos? Em que sentido as estratégias utilizadas para melhor compreender o texto funcionam como estímulos para o processo criativo do ator?
(imagem, reprodução-Cartaz da peça, 2006)

De inicio, foi como escrevi em Fórum, ao responder com minha participação à pergunta lançada pelo aluno Jorge Nunes, para nós cursistas;

“(...) A Gaivota" é um texto complexo que estimula múltiplas leituras, inclusive, de gênero (drama/comédia/farsa etc.), de concepção (no circo/de patins/dança-teatro etc) da encenação por parte do encenador (para Tchecov um drama) e de interpretação, via atores/atrizes (de acordo com a direção). (...) Não vamos esquecer da: "polêmica" do teatro pós-moderno; embora, para Tchecov, (a peça A Gaivota) e para nós, fora concebida num passado bem remoto do quê sinalizo. Tanto que para hoje, há várias possibilidades de leituras e/ou encenaçôes. O que vale é a conjuntura teatral ou a ideia que se quer levantar, enquanto obra dramática e sentido pessoal, profissional e poético." (Re: TCHECOV POR STANISLAVSKY por Lúcio José de Azevêdo Lucena - sábado, 7 novembro 2009, 20:19.).

Por outro lado, em minha leitura de texto transcrevo que, Stanislavski procurou na peça “A Gaivota”, estabelecer uma estratégia de encenação por meio de um plano de trabalho; a direcionar a distribuição e disposição de espaço físico e da atuação entre os elementos constituintes do teatro: personagens\ acessórios de cena\cenário, diálogos de encenação e de atuação em todos os quatro atos da peça. E, de desenhos das cenas em esboços.

Eis aí, uma atividade técnica e meticulosa do encenador, por meio da concepção e da escrita literária, a partir de abordagem textual, sob meu ponto de vista de leitura apreciativa. Isto é, antes de ser levada a peça ao grande público; há um trabalho de articulação de ideias junto ao encenador e depois aos atores\atrizes, antes da arquitetura teatral, de teor racional em valor dramatúrgico.

Assim, há acréscimo de pequenas demandas de movimentos em aspecto visual e acústico. Tanto que, na dramaturgia de Chechov, as implicações em rubricas designam a ação dramática, como: entradas (ex.: pela direita entram Sorine e Treplev); saídas dos personagens ou em suas falas - começamos a entender o enredo e as ações, do ponto de vista da leitura (aspecto literário).
Por outro, em situação de cena teatral, tal resultado do olhar periférico e de pontuação de levantamento de cenas e da criação de imagens pela atividade do Mestre, confere em via de mão-dupla, o métodos de ações físicas via personagens-atores.

Vejam:

Macha diz a Medvedenco, (ainda, sob efeito psicológico de sua crítica pessoal\de personagem em fala; da ação em discurso; quando Ela destaca sobre e como Ele se comporta em tempo presente, mas outrora.):

“(...) você está sempre fazendo discursos filosóficos ou então falando em dinheiro. (...).”

Assim, o espectador passa a compreender: as características físicas e psicológicas (ação interior) dos próprios personagens (exterior), a partir das falas em diálogos externos, proferidos por eles ; além da vivência em situação “real” e dramática de serem como eles suponham que são, ou como deveriam ser.

imagens(reprodução): "A Gaivota", 2006 - realização Teatro da Cornucópia (fundado em 1973)-Lisboa\Portugal

Por fim, faz-se necessário aqui, como dito no texto (STANISLAVSKI: O ENCONTRO COM THECHOV), e de explicitar para nós leitores, sobre “A Gaivota”, que:

não há ênfase em um enredo central que unifica todos os eventos representados. Ao contrário: temos uma diversidade de tramas sobrepostas, (...). Ainda, grande parte das conversações não se reduzem a um tema: elas se dispersam e se confundem em diversas tópicas, sem nenhuma conclusão..(...).”Embora, no dizer de Stanislavski a sinalizar uma visão de interpretação junto aos intérpretes; ele segue:

“(...) Engana-se quem geralmente procura nas peças de Tchekhov interpretar, representar. Em suas peças é preciso ser, ou seja, viver, existir, seguindo a artéria principal da alma plantada profundamente no interior.” [A Linha da Intuição e do Sentimento – texto da semana 3, em estudo.]

De acordo com a citação transcrita acima, reside outro caminho; Stanislavski direciona para nós estudantes de teatro e aos atores em serviço, estratégias utilizadas para melhor compreender o texto (da peça em questão) e que, a priori, devem funcionar também, como estímulos para o processo criativo do ator em ação física e mobilização teatral. E, configuram-se quando:

“(...) a ação interna deve estar em primeiro lugar. Por isto se enganam aqueles que interpretam nas peças de Tchekhov a própria fábula deslizando pela superfície e representando as imagens externas dos papéis sem criar as imagens internas e a vida interna. Em Tchekhov é interessante a configuração espiritual das suas criaturas. (...).”

Ou seja, para o processo criativo do ator, ele precisa acreditar em toda uma gama de vida, de circunstâncias dadas e se deixar absorver pela peça, nos ensaios, pesquisas, na condução do personagem e olhar do encenador.

Abaixo, apresento breves estratégias a se trabalhar com textos complexos via encenação\GRUPO e atuação, que são as seguintes:

estudo do texto (trabalho de mesa) em análise gnóstica a partir do ponto de vista do autor\do encenador\elencocoletividade;
da ação eou divisão da ação dramática e suas características procedentes do texto (lugar da ação, ação física ou de tempo) ou de concepção do encenador;

conceber o espetáculo de acordo com a conjuntura sociocultural e política de encenação, em época anterior ou do momento;

número reduzido ou não de personagens principais, coadjuvantes em favor de elenco ou, não;

eliminação ou corte de diálogos (redundantes ou enxertos de outros);

adequação (ou não) de intérpretes aos personagens da obra encenada;
definição do tempo da ação dramática ou de caráter atemporal;

uso de espaço físico em favor da cena, da cenografia(o universo da peça), da iluminação e do corpo de intérprete(figurino), ou da palavra em cena - projetada e articulada em detrimento da demanda de não prejudicar o aspecto visual ou do movimento acústico, consequentemente, de levar à compreensão da platéia;

jogos dramáticos de improvisação ou teatrais livres e\ou direcionados aos atores, a partir da situação advinda do texto; da concepção das cenas e espetáculo como o todo ou do ponto de vista de objetivos de personagens a ser criados e interpretados, posteriormente.

Dentre outras estratégias em abordagem do decorrer do percurso teatral (ensaios) e de métodos junto ao Texto, surgirão de encontros também a partir dos intérpretes (em traçar planos\metas) e, é sempre mutável em decorrência de novas descobertas.

Tais estratégias apontadas por mim acima, não se esgotam entre si nem tampouco, no campo da cena\interpretação. Logo, as pontuo como exemplificação, de entendimento dessa Atividade.

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