quarta-feira, 21 de setembro de 2011

“O Marinheiro: Uma Viagem Interior” - Uma Montagem Cia. de Teatro Lua, (12\05\1993): 6º Festival Nacional de Teatro (Francisco Beltrão\Paraná)

Crítica por Elie Mario Dfeterius (grego) & Sebastião Milaré (júri do Festival), segundo a publicação (inédita)na íntegra por Lúcio Leonn, (2011)

Premiações:
*Melhor Espetáculo (Juri oficial)
*Melhor Direção (Ueliton Rocon)
*Melhor Ator (Lúcio Leonn)
*Melhor Atriz (Sonia Vitorino)

“O trabalho analítico sobre o texto deu aos atores farto material dramático para suas composições “estáticas”. E assim, a idéia de “teatro estático” e o próprio poema de Pessoa revelaram sua teatralidade oculta. Toda a ação subjetiva, pelo poder de concentração e de expressão dos atores, passou ao nível de percepção, fazendo com que eles, mesmo imóveis fluíssem, passando ao espectador a impressão de um virtual movimento.” (Defterius & Milaré, 1993)

[Elenco: Ana Angélica de Almeida \ Lúcio Leonn \ Sonia Vitorino e Roberto Maur] Imagem e versão original

O poema dramático de Fernando Pessoa, tão belo e vigoroso enquanto leitura, parece teatralmente descarnado, difícil de ser materializado no palco. Encantado com a poesia – como Ulisses com o canto das sereias – muitos encenadores aceitam o desafio de levar à cena O Marinheiro, quase sempre com resultados medíocres. No presente caso, contudo, o encenador Ueliton Rocon venceu o desafio e realizou um espetáculo onde o rigor estético está a serviço da compreensão do poema, transformando em imagens o indizível, fazendo relações cênicas que “materializam” as emanações poéticas que vêm das profundezas da obra.
Tomado como base da encenação a idéia vaga de “teatro estático”, colocada por Fernando Pessoa (obviamente influenciado pelo teatro simbolista francês do século passado e inicio deste), Ueliton fez com os atores importante trabalho analítico do texto. Desvendou-lhe significados e significâncias. Desceu ao fundo desmontando frases, questionando a teia de símbolos, chegando por fim ao núcleo da obra e dali trazendo para a superfície, na remontagem do texto, o pensamento arcaico (ou o universo mítico) sobre o qual se ergue o poema dramático de Fernando Pessoa.


O Marinheiro: Uma Aventura Interior(1993), de Fernando Pessoa. Ceronha Pontes(E) / Ana Angélica Almeida(C) e Lúcio Leonn. Direção\concepção Ueliton Rocon.


A idéia de “teatro estático”, reproduzindo os valores do teatro simbolista, é de uma encenação onde toda a força dramática se concentre na palavra; onde a ação física do ator se restrinja à expressão das emoções (já num princípio de expressionismo) com o mínimo de movimentos. E foi dentro desse conceito que Ueliton e os atores da Cia. de Teatro Lua buscaram os procedimentos adequados para construir a sua versão cênica de O Marinheiro.

O trabalho analítico sobre o texto deu aos atores farto material dramático para suas composições “estáticas”. E assim, a idéia de “teatro estático” e o próprio poema de Pessoa revelaram sua teatralidade oculta. Toda a ação subjetiva, pelo poder de concentração e de expressão dos atores, passou ao nível de percepção, fazendo com que eles, mesmo imóveis fluíssem, passando ao espectador a impressão de um virtual movimento.
A leve adaptação do texto possibilitou a introdução da figura do Marinheiro numa atmosfera onírica, quando as personagens (ou entidades dramáticas) que o invocavam submergiam no sonho ou sucumbiam ao espanto ante o desconhecido (Deus? Seria Deus o Marinheiro?). E quando uma das irmãs indaga se seria o Marinheiro fruto dos seus sonhos ou elas frutos dos sonhos dele, o texto (ou o verbo) oferece a chave de compreensão da obra e se casa com as imagens cênicas, dando realidade à sua irrealidade.
A bela encenação da Cia. de Teatro Lua deve ser vista acima de tudo, através das conceituações cênicas – todas elas claramente colocadas com o rigor da pesquisa e da discussão literária e filosófica da obra. Pode-se discordar de algumas soluções, mas não negar a inteireza do discurso a nível conceitual." (Grifos dos autores)

Elie Mario Dfeterius (grego)
&
Sebastião Milaré
(Júri do Festival)